A gota é uma doença caracterizada pela elevação dos níveis de ácido úrico no sangue e acúmulo de cristais de monourato de sódio nas articulações. A colchicina inibe a multiplicação celular e produz diminuição temporária de leucócitos onde estão os cristais, diminuindo, portanto, a resposta inflamatória local. É rapidamente absorvida quando administrada por via oral, com pico de concentração plasmática entre 30 minutos e 2 horas. Seus efeitos tóxicos mais comuns são a rápida proliferação de células epiteliais no trato gastrointestinal, náusea, vômito, diarréia e dor abdominal, sendo que o tratamento deve ser suspenso tão logo estes sintomas apareçam. Ocorre que a colchicina é um fármaco de índice terapêutico estreito onde a dose terapêutica é muito próxima da dose tóxica, e, no entanto tem sido manipulada em farmácias apesar de especialidades farmacêuticas industrializadas serem facilmente encontradas no comércio. Casos de uso de fármacos de baixo índice terapêutico manipulados em farmácias ocasionarem graves riscos à saúde ou morte têm sido relatados na literatura.
Reconhecendo-se os riscos associados ao consumo de preparações farmacêuticas à base de fármacos de índice terapêutico estreito obtidas por manipulação, a ANVISA editou a RDC nº 67 de 2007, onde estabelece que o próprio paciente assuma o risco da utilização de tais medicamentos por escrito, após ter recebidos as informações sobre tais riscos do médico e do farmacêutico.
O laboratório de Farmacognosia do Instituto Adolfo Lutz recebeu solicitação de análise de cinco cápsulas contendo colchicina, manipuladas em farmácia de manipulação. Segundo o processo que acompanhava a amostra, um senhor de 70 anos por apresentar quadro de dor articular, buscou inicialmente atendimento médico em uma clínica, onde foi atendido por um médico que lhe prescreveu a medicação a ser aviada em farmácia de manipulação, e que segundo foi relatado na ocasião, o médico lhe disse não se tratar de moléstia grave e que com o uso da medicação em breve teria significativa melhora. De posse a receita que havia sido prescrita dosagem de 50mg de colchicina, o senhor dirigiu-se a farmácia de manipulação, onde solicitou a medicação. Após a ingestão da primeira dose da medicação, tendo sentido grande mal, foi necessária a busca de atendimento de socorro em Hospital, que constatou haver sido iniciado um processo de hemorragia digestiva aguda. O paciente foi a óbito no dia seguinte, constatando-se como causa mortis: insuficiência respiratória aguda, estado de choque hemorrágico, hemorragia digestiva aguda e úlcera gástrica, o que ocasionou grande perplexidade, não obstante o transe doloroso dos familiares da vítima. Há informações nos documentos de que a atendente da farmácia contatou com a clínica médica e que foi confirmada a dosagem. O médico, por sua vez, alegou que prescreveu corretamente, pois não existe uso para a dosagem de 50 miligramas.
A literatura científica estabelece dose máxima ingerida de 2,5mg nas primeiras 24 horas para adultos hígidos, e a dose total administrada em ataque agudo não deve exceder a 6mg em quatro dias, contudo no caso em questão o paciente recebeu dose da ordem de 50mg para a ingestão do medicamento. As doses das formulações industrializadas são de apenas 0,5mg ou no máximo de 1,0mg por unidade posológica, portanto neste caso a quantidade ingerida pelo paciente correspondeu a 100 unidades de 0,5mg de especialidade farmacêutica industrializada. Se o médico tinha a intenção de prescrever 0,5 miligramas, mas prescreveu 50 miligramas, estaria incorreto, porém o farmacêutico deveria insistir em pedir esclarecimentos sobre a prescrição do médico para confirmar a dose da receita, uma vez que a quantidade prescrita pelo médico não era usual.
O aparecimento de efeitos tóxicos ocorre horas após a ingestão de doses altas da colchicina e os sintomas iniciais são náuseas, vômitos, dor abdominal e diarréia podendo ser esta sanguinolenta, devido à hemorragia gastrintestinal, pode causar dano vascular extenso resultando em choque, lesão renal com diminuição de produção de urina, fraqueza muscular e paralisia progressiva do sistema nervoso central, quadro semelhante à causa mortis da vítima em questão. A morte pode ocorrer com doses baixas da droga, cerca de 7mg, resultante da paralisia dos músculos responsáveis pela respiração, portanto é importante que os profissionais de saúde façam um rígido acompanhamento do paciente, enquanto estão em tratamento com a colchicina.
Referência:
REVISTA DO INSTITUTO ADOLFO LUTZ – INTOXICAÇÃO POR COLCHICINA EM FORMULAÇÃO MANIPULADA. Disponível em: <http://periodicos.ses.sp.bvs.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0073-98552008000300012&lng=pt> Acesso em 18/05/2011.
Rahiza Kusma
Ou gatinha se sabe tudo de outras coisas também...
ResponderExcluirTo com saudades das aulinhas!!